SAPUCAIA DO SUL/RS

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segunda-feira, 17 de maio de 2010

Sapucaia do Sul e a lei 10639/03

Um breve histórico da questão racial no Brasil

Transladados de terras distantes, os negros que vieram a compor a maior parcela da mão-de-obra da nossa história passaram por imensas dificuldades. Resultado de uma concepção racista, a lógica de negociar seres humanos de pele escura como se fossem gado, perpassou séculos e continentes. A grave situação social, pela qual os descendentes de africanos hoje passa, vem daquele histórico, de barbárie em prol de um dito processo civilizatório. Projetos sociais que hoje se multiplicam visam amenizar as graves consequências de uma herança histórica.

No Brasil pré-colonial, os chamados indígenas viviam conforme a concepção de uma comunidade coletiva, com um grau de “primitivismo” que pouco perdurou após a chegada do homem branco europeu. Rompendo drasticamente com a sistemática da partilha, da igualdade, da liberdade e da solidariedade, o colonizador europeu extirpou riquezas e atacou costumes: um processo de “domesticação” levado a efeito segundo os princípios do catolicismo pós-idade média. Havia um objetivo fundamental, que passava pela obtenção maior possível de bens materiais. Num primeiro momento, esses bens eram pedras e metais preciosos. Não obstante, o processo de apropriação estendia-se aos corpos das indígenas, muitas sendo estupradas pelos desbravadores lusitanos.

A chegada dos escravos africanos foi acompanhada de uma profunda transformação, tanto da história do nosso país quanto da vida dos forçados imigrantes. O território começava a se configurar e dar forma àquilo que viríamos a denominar de Brasil. Atravessando diversos ciclos econômicos, o negro escravo, cujo modo de vida tinha aspectos em comum com os nossos indígenas, foi sendo usado à exaustão. Aqueles que sobreviviam à sofrida escravidão eram mantidos à distância da posse dos meios de produção e do contato com o conhecimento formal. Concomitantemente, constituía-se o país e extirpavam-se traços de humanidade dos descendentes dos povos africanos. Deste processo, resultam profundas contradições, até hoje muito presentes na “guetização” crescente em favelas brasileiras.


Processo de escolarização em terras brasileiras


Bem como a discriminação tão presente na lógica comercial-escravocrata européia, a formação de espaços educacionais em nosso país obedeceu à ideia de inferiorização daqueles que destoavam do fenótipo de padrão europeu. A exploração dos espaços invadidos pelos colonizadores ocorria segundo a perspectiva de que os seres inferiores deveriam se civilizar. Ou seja, especificidades culturais eram jogadas na lata de lixo da história, juntamente com muitos corpos mutilados, violentados. Disfarçados de catequistas, membros de religiões dos brancos promoviam um verdadeiro massacre, destruindo inclusive registros escritos.

“São escassos os registros relativos à população akwe-xerente anteriores ao século XIX. Independentemente de um possível contato com os missionários jesuítas, as poucas historiografias existentes evidenciam que o início da formalidade do ensino, no âmbito da sua realidade, se encontra num modelo educacional catequético. Seja na missão dos capuchinhos ou nas desobrigas dos freis dominicanos, vê-se a escola surgir a partir do olhar de quem se percebe como elemento pertencente ao topo da escala evolutiva, de quem enxerga, nas variadas culturas, um percurso único pelo qual todos devem passar. Essa lógica de pensamento, típica das ideologias dominantes, deu um novo rumo para o processo dinâmico próprio ao contexto sócio-político-cultural das suas comunidades. Do contato adveio a sobreposição de um ser ao outro, um cotidiano ao outro, um sonho ao outro.”

FERREIRA, Rogério. “A educação escolar no universo akwe-xerente”. In A metamorfopsia da educação: hiatos de uma aprendizagem real. Organização Alexandre Dias, Rogério de Almeida. São Paulo, Zouk, 2002, p.108.



O fim da escravidão e a situação do negro no país


O processo abolicionista no Brasil não foi acompanhado da conscientização dos proprietários quanto à reparação da situação de desigualdade aqui estabelecida. A discussão por parte daqueles dava-se quanto à indenização para reparar uma perda material. Alegavam os mesmos que, não podendo mais explorar a mão-de-obra que haviam importado da África, agora estariam em prejuízo.

As elites se acertaram: ficou decidido que os proprietários receberiam a tão pedida indenização. Por outro lado, para suprir a necessidade de mão-de-obra, facilitaram o ingresso de imigrantes para o trabalho em nossas terras. Essa foi a solução apresentada. Quanto aos escravos, que agora saíam dessa condição? Foram relegados à marginalidade; alguns continuaram na mesma situação de perda da liberdade, embora disfarçada, e outros começaram o processo que daria início à favelização em nosso país.

Dadas as circunstâncias históricas, é possível ter uma ideia da atual situação do negro em nosso país. Se a discriminação racial é imensa no Brasil atual pensemos bem como era no final do século XIX!

A lei 10.639 foi criada recentemente para começar a criar condições para corrigir uma questão histórica. Isso porque necessitamos ter consciência sobre os problemas para que possamos dar início ao encaminhamento de soluções. Nesse sentido, as escolas necessitam organizar os seus currículos para abordar a condição de exclusão social em nosso país. Exclusão essa, que se estende a tantos outros segmentos da sociedade.

Em termos de Secretaria de Educação, estamos propiciando formação para nossos professores abordarem em sala de aula a questão das diferenças étnicas. Dividido em dois blocos por noite, o Seminário irá tratar relevantes temas para dar início ao processo de instrumentalização dos nossos profissionais quanto à abrangência de um assunto que diz muito da nossa história.



Vanderlei Genro - Mestre em História, Diretor Pedagógico SMED. 29/setembro/2009

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